O filme The Square (Ruben Östlund 2017) trata o posicionamento dos estetas na aferição do que será arte, através do ponto de vista de um ficcional curador do Museu Real de Estocolmo. De que forma é que a sua autoridade, e a do estatuto do seu próprio museu, são suficientes para a validação dessas mesmas obras de arte? O plot principal do filme centra-se na apresentação de uma obra que é simplesmente um quadrado pintado no chão com a seguinte mensagem: “The Square is a sanctuary of trust and caring. Within it, we all share equal rights and obligations”. A partir deste ponto, o curador é levado para fora da sua zona de conforto, ao vender uma mensagem de teor social que ele próprio não consegue entender totalmente por se encontrar numa camada social privilegiada.
Deste modo, a problemática deste filme centra-se no afastamento dos estetas e da própria arte de uma certa realidade social, mesmo que muitas vezes seja a sua maior porta-voz. Até que ponto é que as estruturas que movimentam os mundos da arte ainda sustentam lógicas de privilégio que impossibilitam a articulação com a diversidade que subsiste fora desses círculos? Penso que no caso da música, esta problemática incide na linguagem como único veiculo estético. A necessidade de um apoio objectivo resulta numa demonstração de racionalidade excessiva, e parece afastar o produto musical de qualquer ideia abstracta. Schoenberg “não morreu”, Pierre Boulez “tão pouco”, e a sensibilidade desvanece-se em sistemas matemáticos e geométricos que compõem a linguagem musical, por medo de “voltar atrás na história”. Na verdade, torna-se difícil uma ideia de “voltar atrás na história” de algo que já não consegue encontrar uma terminologia: erudita, clássica, tradição escrita… será a matemática a última prova de “arte elevada”? Com preços entre os 5 e os 25 euros e com a diminuição de códigos de distinção social – note-se que atualmente já não é propriamente necessário um fraque para entrar, por exemplo, no Teatro São Carlos – este estilo de música sem nome está cada vez mais democratizado, mas distante em desentendimentos estéticos, que querem manter um certo estatuto através da linguagem.
Em The Square, esta problemática da high culture é representada através da famosa cena da performance homem macaco (excerto no vídeo abaixo). O desconforto que causa, expõe a fragilidade do snobismo, que não consegue manter a sua postura perante algo que lhe é exterior, não conseguindo esconder até um certo desprezo. Embora aplicado às artes visuais, em The Square é possível observarmos esta mudança de paradigma, demonstrado os vários estetas de um mundo da arte, e de como a autoridade de alguns se torna insustentável pelo afastamento da realidade da própria sociedade em que está inserida.
- Ângela Flores Baltazar
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